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qorpo santo


a reforma da ortografia

 

 

 

Frontispício para hum jornal qe denominarei a saúde

Fundado no sábio poeta português Castilho, no literato brasileiro António Alves Pereira Coruja e em meu distinto Mestre de tantas artes, de tantas ciências Marquês de Maricá, desde 1862 que levado de uma força irresistível, e do mais veemente desejo de ser de qualquer modo louvável útil a meus semelhantes, e especialmente a meus alunos, ensaiei a Ortografia de que pouco a pouco me vou servindo, e transmitindo aos sábios a cuja crítica sujeito.

O primeiro suprimia por exemplo o U na palavra Que, em seu abecedário para aprender-se a ler nas escolas; o segundo diz e exemplifica em uma nota de sua gramática Qe o que se pode fazer com menos, não se deve fazer com mais!

O terceiro, ensinou-nos que a civilização moderna é mais devida a derrubada de erros antigos que a descoberta de verdades novas.

Qualquer deles felizmente para mim prova tão evidentemente o qe afirma, qe nada fica a desejar, a combater ou contestar.

Sou de sua opinião, por gênio, por índole e inclinações, por costume, por hábito, por conveniência, nunca vacilei pois, nem jamais o farei, para que tão grandes melhoramentos que se podem efetuar nesta quarta parte da gramática nacional, se vão pouco a pouco introduzindo!

As minhas obras quase só eu as entendo tantas foram as inutilidades por mim suprimidas! Acho porém cedo para que desde já se faça tanto!

Os timoratos se receiarião: os aterrados às outras línguas, e principalmente à latina não qererião, como não querem perder uma coisa inútil para nós só pelo simples fato de tal coisa ser naquela indispensável, como se não fosse loucura cometermos todas as más ações; vícios e erros de nossos pais só porque eles os praticaram!

Quiçá outros levados de alguns outros prejuízos, muitos de condenável preguiça, também a rejeitassem!

Assim pois entendemos dever adiantar somente o que nos parece mais fácil, e de pronta aceitação.

Entram neste número as seguintes reformas:

1° Supressão do U em todas as palavras que não soa.

2° Supressão de uma das letras que usam dobrar inutilmente.

3° Escrever Q em palavras em que o X e outras letras furtam o som desta.

4° Empregar sempre o G com o som forte que tem em Gado, Guerra etc. cuja segunda palavra se pronunciará do mesmo modo, escrevendo-se Gera.

5° Supressão do H em palavras que não soa, nem serve para distinção alguma.

6° A figura Z para soar sempre ere; como em Para etc. ficando esta para só ter som forte entre vogais, e assim escrevermos — Caro — pronunciarmos como o fazemos em Carro. E cazo, etc.

7° Uso do S em todas as palavras que se pode dispensar o C cedilhado. Esta letra eu suprimo, pois para soar Q temos esta, e para soar S, temos também esta.

8° Não empregar dois S, senão quando o primeiro soa com a primeira sílaba e o segundo com a segunda. Nem com o som Z, senão nas palavras compostas como em dés-e-seis, des-obstruir, des-arranjar etc.

9° Inutilizar o uso do ch, qer para o som de X visto que temos este, quer para o som de Q, visto também haver este para assim soar. E por isso em vez de escrevermos Sexo e pronunciarmos Seqso, escrevamos deste segundo modo: tenho ouvido muita jente já velha, que andou anos em escolas, pronunciar ainda do primeiro modo que acima escrevi.

10° Não soar o X, S, como muita jente uza em Felix e em outras palavras, nem também dar tal som ao Z, porq não precisamos: muitos o fazem entretanto em dez, pez, gaz, arroz, e em infinitas outras palavras.

11° O Y por inútil deve desaparecer do Alfabeto como aconteceu ao desuzado W.

São estes pois os melhoramentos que tenho convicção de que se forem adotados o indivíduo que com a ortografia antiga gastava um ano em aprender a ler, o conseguiria em 6 ou 8 meses quando muito.

Oxalá estas notas, estes frutos de incessante e acurado estudo sobre o modo mais fácil e pronto de transmitir a meus alunos por espaço de 10 a 12 anos os conhecimentos por mim até então adquiridos, possam achar em inteligências e em corações Brasileiros aqele abrigo, aqele amparo, aqela proteção que em mim encontraram.

Ainda que porém ninguém enxergasse o melhoramento que eu vejo em tal reforma com a adoção do que indico, nem por isso deixaria eu de gozar aquela tranqüilidade da consciência, aquele prazer que sempre experimenta quem desinteressadamente para consigo se esforça, trabalha, e leva ao conhecimento de seus discípulos tudo quanto crê firmemente que lhes é, ou que lhes pode ser útil.
 



JOSÉ JOAQUIM DE CAMPOS LEÃO é gaúcho, da cidade de Triunfo. Dramaturgo, professor, ensaísta, escritor e louco, escreveu as peças As Relações Naturais e O Marinheiro Escritor. Recentemente passou a assinar seus livros como Qorpo Santo.

 


 

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