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a arte da astúcia | ricardo pinto inspiração nos quadrinhos
Este pequeno texto é mais a
confissão de um viciado do que propriamente um comentário refletido sobre
a milagrosa e bela arte seqüencial, gibis, para os que como eu se
alfabetizaram com cores e balões. Não me interessa tanto fazer uma defesa
do valor destas obras, que na maioria das vezes se reduzem mesmo a lixo,
nos piores casos, lixo imperialista apologético, e que mesmo nos melhores
autores carece das virtudes da boa literatura ou da boa pintura. Por outro
lado, como certa vez disse Alan Moore, é inadequado encarar as histórias
em quadrinho como uma forma de literatura, ou de pintura, ou de
quase-cinema, ou mesmo como uma fusão de técnicas: é uma narrativa
distinta, e nesta diferença é que pode e deve ser medida. O que é
absolutamente correto quando pensamos o quanto são conservadores e pobres
os designs, grafismos, diagramações e a produção geral dos livros normais
em comparação ao delírio visual das histórias em quadrinho. A medida desta
figuração ácida, figuração pretensamente linear mas que se dissolve em
atonalismos, cortes, que tenta, como no cinema, escandir o tempo nos
balõezinhos e nos quadradinhos ilustrados que formam a ação dos gibis, mas
que no gesto mesmo desta escultura, e agora distintamente do cinema,
dissolve a ação, desconcentra-a, impede a síntese. Se a gramática básica
do cinema é o corte, o close e a panorâmica, maneiras de criar tensão, de
distender e logo após intensificar, a gramática dos quadrinhos se baseia
na dispersão da forma, em sua multiplicação e dispersão. Lançando mão de
categorias pobres, poderíamos dizer que a gramática cinematográfica é
clássica enquanto a da arte seqüencial é barroca, ou que são dois caminhos
assumidos pela modernidade: o otimismo humanista e os longos delírios de
cubistas, surrealistas e de todos os outros que acidificaram o registro do
homem na vida.
RICARDO PINTO é poeta e escritor, ou quase. Atua como professor, edita
a revista Confraria e é sócio da editora Confraria do Vento. É mestre em
Literatura Comparada e teve alguns artigos e poemas publicados em sites e
revistas, assim como um livro de poemas Amar-o-mar e Outros Poemas (2000).
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