Um
espectro ronda o planeta: a crise do capitalismo mundial. As velhas e
novas potências se uniram contra ela: o papa e os trojans, a peste-digital
e o orkut. Em cada boteco de Manhatan ou num quiosque sujo de Dubai, em um
jeriquixá ou num bólide lunar está lá a manchete: o crash. Decerto, este
não foi um ano de bons vinhos. Um pequeno avanço aqui e acolá, mas de
resto as chagas finalmente se auto-revelaram.
Não entendam que essa crise nos fez atrasar a revista ou suprimir um
número. Não! Mesmo porque não somos subvencionados, não temos patrocínio,
nem apoio financeiro qualquer. Somos uma revista independente, na qual o
pensamento é a crise. Reformulações internas nos levaram a discutir nossas
veredas e nos fizeram retardar este número. O número 22, suprimido,
existe, é claro, mas em uma realidade insondável e não comentaremos mais
sobre isso, por medo de represália de seres multidimensionais.
Então chegamos a um número 23, aprisionados pelas imagens do casal Robert e
Shana Parkeharrison. Não nos iludamos com suas curvas performáticas, elaboradas
em surpreendentes armadilhas, elas (as imagens) querem conversar. Os ensaios de
Jorge Bucksdricker, Anna Carolina da Costa Avelheda, Eduardo Galhardo e Nilson
Oliveira (aquele mesmo editor da revista Polichinello) também catapultam o
desejo do diálogo.
Os contos parecem eco-literários. Clodie Vasli e Raphael Vidal passeiam num
jardim de vespas, protegidos por espessa camada lítero-abismal. Jaime Sáenz vem
com toda sua alegoria, livre das poeiras, novinho em folha phantascópica. O
mistério da poesia nos é finalmente revelado por Chacal, Cândido Rolim e Alan
Mills e na eletropoesiacústica de Ricardo Corona. E por aí nós costuramos o
dorso virtual de nossa revista real. Nas colunas, mudança com a grande chegada
de Clóvis Bulcão e Luís Serguillha.
No mais, meus nobres, este tempo (final de ano, final de mundo, final de tudo)
está povoado pelo espírito de Babel. Para que não nos esqueçamos: o nosso
compromisso tem sido com o assombro, com a surpresa, com as sombras. Façam bom
proveito, pois nós não acreditamos em Papel Noel, figura tragicômica (seu saco é
uma bomba-atômica, como diria Ascenso). Para todos, uníssonos com Chacal: o
caralho dos poetas. Ja Ma La!